quinta-feira, 23 de junho de 2005

Resposta ao último post do Lagarto

Aqui vai mais uma proposta de leitura. O meu pai anda a escrever sobre isto e deu-me autorização para vos deixar este trecho. Quero só acrescentar, como resposta às leituras que o Lagarto propõe, que Álvaro Cunhal não é 25 de Abril... há muito mais para entender o 25 de Abril para além do que foi Álvaro Cunhal no nosso país...


"Saying goodbye doesn't mean anything. It's the time we spent together that matters, not how we left it"
"Dizer adeus não significa nada. O que interessa é o tempo que passamos juntos, e não a forma como nos despedimos"
Trey Parker (1969-) and Matt Stone (1971-), TV scriptwritters

Se estiverem lembrados da frase com que abri a minha primeira carta sobre "O dia seguinte I" : " Todo o mundo é composto de mudança....."
É aqui que está o busílis de muitas questões políticas, científicas e religiosas. Quem não assimilou e não se comporta tendo em conta esta máxima, tem poucas hipóteses de sobrevivência neste mundo. Todos os seres neste universo são inadaptados por natureza. É por isso que morrem um dia. Todos têm uma capacidade limitada de encaixar a mudança.

Álvaro Cunhal teve uma vida física e psicológica longa: permaneceu durante quase 80% do século XX. Mas o mundo mudou com uma velocidade cada vez mais acelerada no último quarto do século XX. Mudou primeiro a estrutura da produção, depois a estrutura da sociedade, em seguida a estrutura da economia e por último começou a mudar aceleradamente o figurino político no mundo. Nós os sobrevivos no ano da graça de 2005, estamos na crista da onda dessa mudança.
Se olharmos um pouco para trás, para o lado e para a frente, dar-nos-emos conta da amplitude deste movimento, que afecta pela primeira vez na História a globalidade dos seres humanos.

Mudou primeiro a estrutura da produção......
Desde tempos imemoriais, o valor dos bens de comércio é proporcional ao trabalho gasto para os obter. Karl Marx sistematizou muito bem esta ideia no seu trabalho "O Capital". Mas este economista, imerso no mundo do início da produção industrial, não conseguiu entender (ou não o deixou bem escrito) que o trabalho humano está incorporado nos bens de comércio.
Temos de entender que o ambiente da produção industrial do início do capitalismo moderno no sec XIX mascarava facilmente a estrutura do trabalho incorporado nos bens comerciais e que mesmo a um génio como Karl Marx pode ter passado despercebida a verdadeira estrutura de incorporação do trabalho nos bens.
Aquilo que falta assimilar à maioria dos Marxistas e em particular aos Marxistas Leninistas, é que o trabalho incorporado nos bens é de dois tipos:
- Trabalho vivo, pago ou presente, que inclui o trabalho de toda a cadeia humana, desde o projectista, ao patrão, ao operário da fábrica e aos trabalhadores do ponto de venda ou distribuição.
- Trabalho passado não pago, que inclui todo o saber e técnica acumulados, de gerações mortas passadas ou ausentes, e ainda o trabalho de gerações contemporâneas vivas, condensado nos automatismos cujo custo de reprodução chega a ser milhares de vezes menor do que o seu desenvolvimento.

No último quarto do século XX assistiu-se àquilo que foi convencionado chamar-se 2ª revolução industrial ou como Álvaro Cunhal designava nos seus escritos a revolução científico-técnica. Foi essa mudança que Álvaro Cunhal e outros eminentes estudiosos do mundo inteiro (incluindo em particular a quase totalidade da intelectualidade dos países do bloco soviético) não assimilou e o que é mais grave, ignorou ou classificou erradamente como uma fase moderna do capitalismo.
Essa revolução industrial, baseada nos automatismos e robotização, diminuiu drasticamente o trabalho vivo ou presente incorporado nos bens, o que fez com que o factor base determinante do seu preço descesse para frações do que teria pelo método de produção sem automatismos. Isso é muito visível nos bens que mesmo muitíssimo complexos, são quase totalmente produzidos de forma automática como os bens das:
- tecnologias electro-electrónicas,
- comunicações,
- automóveis,
- químicas (em especial dos plásticos) e até...
- têxteis (produção do fio e do tecido) e nos últimos 5 anos mesmo na confecção.

Depois a estrutura da sociedade....
O reflexo social desta mudança foi a grande diminuição em números absolutos e em percentagem da classe operária na sociedade. Igualmente diminuiu a sua influência política.
No momento presente pode já calcular-se sem grande esforço a data a partir da qual a classe operária será uma classe residual na sociedade, tal como hoje são os artesãos e outros. Isso deve acontecer a partir do meio do século XXI talvez lá para 2075 (pena eu já cá não estar para ver!).
Ora aqui está ! Isto é exactamente o contrário do que profetizam os Marxistas Leninistas e do que Álvaro Cunhal escreveu e deu como directivas ao Partido Comunista Português.
Aqueles que elegem o Marxismo Leninismo como Bíblia e a classe operária como Messias Salvador têm uma atitude religiosa, e por isso, uma fé inabalável no seu destino glorioso redentor da Humanidade e criador do Homem Novo, como diziam os comunistas Russos, que acreditavam ter sido os primeiros a atingir essa meta.
Mas como dizia Galileu aos inquisidores referindo-se à Terra que queriam que fosse o centro do universo criado por Deus: " ... contudo ela move-se".

por António Subida

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